Na última terça-feira, a polícia do Rio de Janeiro deflagrou uma operação em duas favelas da cidade, resultando em 121 mortes, incluindo quatro policiais, e um número desconhecido de feridos. A Defensoria Pública do Brasil relatou 132 óbitos na ação, um número superior ao divulgado pela polícia. Policiais e soldados, apoiados por helicópteros, veículos blindados e tropas terrestres, miraram o Comando Vermelho. A seguir, alguns pontos cruciais sobre a criminalidade e as operações policiais de grande escala como estratégia de combate às gangues.
A origem e ascensão do Comando Vermelho: O Comando Vermelho surgiu no final da década de 1970 em uma prisão do Rio de Janeiro, onde criminosos comuns e presos políticos da ditadura militar brasileira eram mantidos juntos. Eles começaram a se organizar para se proteger da violência estatal dentro das grades. Com o tempo, o grupo se expandiu para fora das prisões, estabelecendo-se nas favelas do Rio e entrando no tráfico de drogas. Conforme o Brasil intensificou sua “guerra às drogas”, o mercado de entorpecentes se tornou mais lucrativo, impulsionando o poder do grupo, segundo Claudio Ferraz, policial aposentado do Rio com décadas de experiência no combate ao crime organizado. Ao longo do tempo, o Comando Vermelho fortaleceu seu controle territorial e expandiu suas operações criminosas. Nos últimos anos, o grupo cresceu internacionalmente, especialmente na Europa. Atualmente, compete com seu principal rival
, o Primeiro Comando da Capital (PCC) de São Paulo, pelo controle das rotas e territórios internacionais de drogas, de acordo com especialistas e autoridades.
As favelas como alvo: Esta semana, o clima era sombrio nas comunidades da Penha e do Complexo do Alemão, onde ocorreram as últimas operações. Os rostos das pessoas estavam majoritariamente sérios, as lojas fechadas. Rene Silva, jornalista e ativista no Complexo do Alemão, disse que essas operações têm um forte impacto psicológico. “Nunca testemunhamos nada parecido na história do Brasil”. E após as operações, ele disse: “O crime continua, tudo permanece igual”. William de Oliveira, líder comunitário na favela da Rocinha, afirmou que tem sido um período difícil para os moradores das favelas do Rio de Janeiro, onde, segundo ele, vivem todos os tipos de pessoas, não apenas criminosos. “Pessoas em conflito com a lei existem em todos os lugares. Na favela, alguns estão envolvidos com o tráfico de drogas ou roubos. Mas também há aqueles na alta sociedade, em qualquer profissão. Com que frequência você vê operações policiais e prisões acontecendo em outros lugares?”, questionou.
Ineficácia e ganhos políticos: Em agosto, o Brasil lançou uma ofensiva contra o crime organizado, apreendendo 1,2 bilhão de reais (cerca de US$ 220 milhões) em ativos ligados a um esquema de lavagem de dinheiro envolvendo o setor de combustíveis e fundos de investimento. A polícia prendeu cinco suspeitos e executou centenas de mandados em todo o país, inclusive em bairros comerciais ricos, sem disparar um único tiro. “Essa operação revelou a conexão entre o crime e a riqueza”, disse Daniel Hirata, sociólogo da Universidade Federal Fluminense que mapeia a atividade criminosa no Rio. “Frequentemente associamos o crime organizado à pobreza urbana, mas ele sobrevive por meio de laços com as elites políticas e econômicas”. O Grupo de Estudos sobre os Novos Illegalismos da universidade registrou mais de 1.800 operações policiais na área metropolitana do Rio este ano. Apenas 1,3% foram consideradas eficazes, com base no número de prisões e vítimas. Em 2024, a polícia matou 6.243 pessoas no Brasil — 14% de todos os homicídios — de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, chamou a recente operação de “sucesso”, apesar das mortes de quatro policiais. Mas com centenas de mortos, o policial aposentado Ferraz a descreveu como “bárbara”, vendo a operação como parte de uma luta política pelo controle da cidade. À medida que o Brasil se prepara para as eleições presidenciais e locais do próximo ano, as pesquisas mostram que a violência é a principal preocupação para a maioria dos brasileiros. Para alguns, operações de grande repercussão podem servir como uma estratégia para ganhar votos, disse Ferraz.
Um campo de batalha político: Castro, aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, descreveu os grupos criminosos locais como “narco-terroristas” em declarações oficiais sobre as recentes operações policiais, ecoando a administração Trump em sua campanha contra o contrabando de drogas na América Latina. Parlamentares conservadores também têm pressionado por mudanças na lei federal para definir as gangues de drogas como terroristas. O senador Flávio Bolsonaro, um dos filhos do ex-presidente, disse na plataforma social X que estava “com inveja” das operações militares dos EUA que visavam barcos de contrabando no Caribe. No início deste ano, o secretário de Segurança do Rio, Victor Santos, afirmou que planejava enviar relatórios de inteligência da polícia estadual às autoridades americanas buscando o reconhecimento formal dos grupos criminosos do Rio como “organizações narcoterroristas”. Mas especialistas em segurança e a administração do presidente de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva rejeitam essa terminologia. O ministro da Justiça do Brasil, Ricardo Lewandowski, disse a jornalistas na quarta-feira que as gangues de drogas do Brasil não atendem à definição legal de terrorismo sob a lei nacional porque não se envolvem em violência por meios políticos ou ideológicos.
Apelos para investigar a última operação: Organizações de direitos humanos pediram investigações sobre as mortes, descrevendo a operação como uma das mais violentas da história recente do Brasil. A operação policial desencadeou um debate político nacional. O governador Castro culpou o governo federal por não oferecer apoio, enquanto o ministro Lewandowski afirmou que nenhum pedido foi feito e pressionou por um projeto de lei para unificar os sistemas de inteligência policial em todo o Brasil. Em resposta, o governo federal enviou representantes ao Rio e anunciou um gabinete de emergência para combater o crime organizado. O presidente Lula também sancionou uma nova lei que fortalece os esforços contra grupos criminosos, e o Senado lançará uma investigação na próxima semana sobre a expansão do crime organizado.
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Esta matéria foi adaptada e reescrita pela equipe editorial do TudoAquiUSA
com base em reportagem publicada em
The Independent
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