As preocupações com uma possível bolha financeira têm ganhado força, tanto na mídia especializada quanto em relatórios de instituições financeiras. O Fundo Monetário Internacional (FMI) dedicou a última edição de seu Global Financial Stability Report para analisar os sinais globais desta bolha, que se mostra mais evidente no mercado de ações de empresas de inteligência artificial. Esse segmento, que vivencia um forte crescimento de investimentos, apresenta indícios claros de valorização especulativa. Bolhas de preços são comuns no capitalismo e se tornaram mais frequentes e intensas a partir da década de 1980, devido à financeirização da economia e à desregulamentação dos mercados. Esse cenário ampliou os casos em que ativos atingem valores desvinculados dos fundamentos econômicos, tornando as bolhas mais comuns e impactantes. Destaque para a bolha .com, a imobiliária, a de criptomoedas e a das empresas de IA gerativa. Esses episódios compartilham características como narrativa otimista sobre o setor, que atrai investidores e fomenta expectativas exageradas; acesso facilitado ao financiamento, direcionando mais recursos ao segmento, mesmo com riscos crescentes; descolamento entre os lucros das empresas e os preços de suas ações, indicando valorização especulativa; e presença de risco sistêmico, com potencial de gerar efeitos em cadeia na economia. A crise de 2008 é um exemplo desse processo. No caso específico da IA, é crucial analisar
seus indicadores. Para compreender seu desenvolvimento, é preciso considerar o contexto histórico das bolhas financeiras, com atenção à situação geral dos mercados e à atuação dos bancos centrais. A caracterização de uma possível bolha no segmento de inteligência artificial deve partir da comparação entre seus indicadores e os do mercado acionário em geral. Dados recentes mostram que, entre 2023 e 2024, o S&P 500 registrou alta de 58%, enquanto as chamadas “sete magníficas” tiveram valorização de 156%. Métricas como o valor da empresa em relação ao EBITDA e o múltiplo preço/lucro indicam sobrevalorização. Mesmo para o mercado como um todo, os números já são altos. No setor de tecnologia, esses múltiplos são ainda maiores, alcançando patamares extremos nas “sete magníficas”. A contraposição à tese da bolha argumenta que, apesar dos múltiplos elevados, os resultados em vendas e lucros têm crescido, o que reduziria esses múltiplos. No entanto, esses resultados têm sido mais lentos do que o esperado. Segundo essa visão otimista, o aumento da produtividade e dos lucros justificariam a valorização das ações, com limites de curto prazo de natureza física, como a escassez de chips. Diversos analistas, como o prêmio Nobel de Economia Daron Acemoglu, apontam que os ganhos de produtividade e a redução de custos decorrentes da IA são modestos. O foco central está nas limitações de uso da IA nas empresas. Um relatório do Massachusetts Institute of Technology (MIT) destaca e questiona cinco mitos: a IA substituirá a maioria dos empregos em breve; a IA Generativa está transformando os negócios; as empresas são lentas na adoção de novas tecnologias; o maior obstáculo para a IA é a qualidade do modelo; e as melhores empresas estão construindo suas próprias ferramentas de IA. A perspectiva otimista, defendida por empresas de tecnologia e investidores, justifica os múltiplos elevados pelo desempenho esperado das empresas. No entanto, essa narrativa enfrenta obstáculos na prática, com a incorporação da IA sendo mais lenta e complexa do que o previsto. As principais barreiras incluem dificuldades técnicas, limitações de infraestrutura e desafios na adaptação dos fluxos de trabalho. É possível analisar o risco sistêmico do setor de tecnologia a partir de três grupos de empresas: as sete magníficas, as Pure-play IA e as Foundation Models. Cada grupo apresenta diferentes estágios de desenvolvimento e consolidação, refletindo em múltiplos distintos. As Foundation Models, por exemplo, têm estimativas de 20 a 400 vezes o valor de mercado/EBITDA. Apesar das diferenças, há forte interconexão entre os segmentos. Além dos múltiplos elevados, cada grupo carrega riscos específicos. Em 2024, as startups de IA captaram cerca de 110 bilhões de dólares, um aumento de 60% em relação ao ano anterior. O segmento intermediário das Pure-play IA mostra-se vulnerável, enfrentando concorrência das big techs e das novas entrantes. Mesmo as sete magníficas não estão imunes. No primeiro semestre de 2025, indicadores de P/L superaram 30 em várias delas, e chegaram a 100 no caso da Tesla. O estouro da bolha pode começar em qualquer um desses segmentos, com efeitos dependentes do risco sistêmico, das interconexões empresariais, do financiamento, dos investimentos, da alavancagem e dos múltiplos praticados. A bolha da IA parece cada vez mais evidente, inflada por um desempenho desigual e pela euforia dos ciclos especulativos. Seu estouro, com data e consequências incertas, pode gerar efeitos profundos na economia global.
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Esta matéria foi adaptada e reescrita pela equipe editorial do TudoAquiUSA
com base em reportagem publicada em
Cartacapital
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