A Controladoria-Geral da União (CGU) constatou que a Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer) inseriu informações falsas nos sistemas do INSS e da Dataprev, solicitando a inclusão de mais de 3,3 mil descontos em benefícios de pessoas já falecidas. A informação consta em um relatório da CGU encaminhado à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS, que serviu de base para a abertura de um processo administrativo de responsabilização (PAR) contra a entidade. A Conafer está entre as entidades investigadas na chamada “farra do INSS”. No relatório, a CGU identificou “importantes elementos de prova” que indicam fraudes e irregularidades cometidas pela confederação na solicitação de descontos em benefícios previdenciários. Em algumas situações, a CGU apurou que o tempo entre o óbito da pessoa e a solicitação de inclusão de desconto pela Conafer ultrapassou oito anos. A Dataprev encaminhou informações que permitiram constatar que, ao longo do Acordo de Cooperação Técnica (ACT), a Conafer solicitou a inclusão de descontos que não foram efetivados, pois os benefícios estavam inativos. Em diversos casos, a inativação ocorreu devido ao falecimento do titular do benefício, conforme destacou a CGU no relatório. Em levantamento, identificou-se que, em pelo menos 3.366 oportunidades, a entidade tentou incluir descontos em benefícios já encerrados por causa do óbito do beneficiário
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A Conafer arrecadou cerca de R$ 688 milhões de descontos associativos de trabalhadores rurais e indígenas inativos desde 2019, segundo a CGU. O presidente da Conafer chegou a ser preso durante depoimento à CPMI do INSS por falso testemunho. O ministro da CGU, Vinícius Marques de Carvalho, depôs na CPMI do INSS e falou sobre o trabalho do órgão na fiscalização das entidades que realizaram descontos indevidos de aposentados e pensionistas.
A Conafer, procurada pela reportagem, afirmou que não teve acesso ao relatório e nem foi chamada para prestar esclarecimentos. A entidade ressaltou que não é responsável pela filiação de associados, pois atua como confederação que filia CNPJs, e que o processo de filiação é feito por meio de associações, sindicatos e cooperativas. A entidade também informou que iniciou um processo interno de investigação em todas as entidades filiadas.
Após a Operação Sem Desconto, o INSS suspendeu os Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com as entidades associativas. A autarquia federal abriu um canal para que as pessoas pudessem reconhecer ou contestar as adesões às entidades associativas. No caso da Conafer, a CGU identificou um quadro alarmante de descontos não autorizados e a falta de contestação por parte da confederação. Do total de 329.432 manifestações registradas sobre a Conafer, 326.691 eram de beneficiários que não reconheceram o desconto, o que representa 99,2% do total de manifestações. A CGU concluiu que a “expressiva maioria” dos descontos nos benefícios do INSS estava sendo feita sem autorização. A Conafer não contestou 80% das reclamações, o que corresponde a 261.653 pessoas. A falta de contraprova pela entidade, segundo o órgão federal, representou “em reconhecimento tácito da irregularidade” dos descontos indevidos.
A CGU também constatou que a Conafer apresentou fichas de filiação falsas em nome de uma criança de nove anos e de pessoas mortas há pelo menos 20 anos. A entidade entregou os documentos ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A CGU classificou a situação como absurda. Ao confrontar as datas das assinaturas com os registros de óbito, verificou-se que algumas autorizações apresentavam datas posteriores ao falecimento. Segundo a CGU, essas tentativas de inclusão ocorreram em um período em que o INSS não exigia a apresentação das fichas de filiação no momento da inclusão. O relatório não especifica quantas pessoas falecidas tiveram seus dados utilizados na fraude, mas o órgão federal apresentou quatro fichas de pessoas já mortas, além do cadastro do menor de idade. A CGU identificou um “padrão semelhante” em todos os casos. Além das assinaturas falsas, a Conafer também teria fabricado os e-mails de cadastro dos beneficiários.
Em depoimento à CPMI do INSS, o presidente da Conafer, Carlos Ferreira Lopes, sugeriu que a responsabilidade pelos descontos em benefícios de pessoas falecidas não seria da Confederação, mas do próprio INSS. O relator do colegiado, Alfredo Gaspar (União-AL), questionou Lopes sobre as fraudes em cadastros da Conafer. O presidente da Conafer respondeu com ironia, citando o escândalo previdenciário. Para a CGU, a Conafer dificultou o trabalho de fiscalização com a omissão de fichas de filiação. A entidade não apresentou documentação completa em nenhum dos casos e, em 42 casos, apresentou de forma incompleta, e em 8 casos, sequer apresentou documentação. A CGU destacou que há indícios de que a atuação da entidade ultrapassou a realização de descontos não autorizados e alcançou condutas para obstruir a atividade estatal de controle, especialmente do INSS.
A Conafer, em resposta, afirmou que as informações divulgadas não correspondem aos números oficiais e aos sistemas que possui acesso. A entidade alega que, ao acessar o sistema do INSS, constatou 328.772 fichas, das quais 197.264 eram duplicadas, restando 131.508 fichas válidas. Destas, 72.879 estão em processo de resolução, 304 processos já foram respondidos, 30.500 valores foram estornados e 38.851 fichas foram retiradas do sistema antes do prazo de resposta. A Conafer ressalta que apenas 78 respostas constam como “válidas” no sistema do INSS. A entidade também afirma que mantém compromisso com a transparência e a boa-fé, com ouvidoria ativa e estornos mensais, além de responder por diversos canais de comunicação. A entidade deu início a um processo de investigação em todas as entidades filiadas. A Conafer reitera que não realiza a filiação de associados, sendo esta responsabilidade das associações, sindicatos e cooperativas.
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