Poucos líderes mundiais ousam desafiar Donald Trump tão abertamente quanto o presidente colombiano Gustavo Petro. Enquanto muitos preferiram a cautela desde que o republicano assumiu o cargo, Petro irritou Trump, bloqueando voos de deportação, pedindo em Manhattan que soldados americanos desobedecessem ordens e acusando os EUA de assassinato em ataques a barcos no Pacífico oriental. Na terça-feira, 12 de dezembro, Petro anunciou a suspensão do compartilhamento de informações de inteligência com os Estados Unidos enquanto os ataques continuarem. O ministro do Interior, Armando Benedetti, tentou minimizar a situação, alegando uma "má interpretação" e afirmando que a cooperação continuaria. Trump, por sua vez, já chamou Petro de "chefe ilegal das drogas", revogou seu visto e o incluiu em uma lista de sanções normalmente reservada a criminosos e violadores de direitos humanos. Para Petro, ex-rebelde durante o longo e brutal conflito interno da Colômbia, enfrentar adversários não é novidade. Conhecidos o descrevem como um homem movido por suas convicções, um crítico da corrupção e da desigualdade que se tornou o rosto combativo da esquerda colombiana. Essa mesma determinação, segundo eles, alimenta sua disposição de confrontar Washington, mesmo com seu governo enfrentando dificuldades internas devido à violência persistente, escândalos e turbulência ministerial. Para seus admiradores, o confronto com Trump é a maior batalha de uma cruzada de décadas
contra os poderosos. Para seus detratores, é uma demonstração irresponsável de ego e um líder mais preocupado em se promover como um campeão moral global do que em governar efetivamente em casa. O embaixador colombiano em Washington, Daniel García-Peña, elogiou Petro por colocar debates importantes no cenário mundial. "Acho que ele está do lado certo da história", disse ele em sua casa em Bogotá, após Petro tê-lo chamado de volta brevemente durante uma disputa diplomática recente. "Ele foi, na minha opinião, muito, muito corajoso por se levantar e dizer o que acredita." No entanto, o ex-ministro da Educação de Petro, Alejandro Gaviria, que renunciou no início de 2023 por discordar de uma proposta de medida de saúde do governo, afirmou que, embora Petro possa ter "uma preocupação genuína" com a humanidade, ele não "internaliza as consequências, impactos ou efeitos sobre a Colômbia". Essa tensão entre ambição e diplomacia tem definido seu recente confronto com Washington. Os Estados Unidos revogaram o visto de Petro em setembro, após ele pedir que soldados americanos desobedecessem Trump em um protesto pró-Palestina em Nova York. Desde então, o governo Trump intensificou uma campanha para destruir barcos e matar tripulantes que, segundo ele, estavam envolvidos com o tráfico de drogas. Muitos especialistas jurídicos classificaram isso como assassinato extrajudicial. Os ataques começaram no Caribe, mas se espalharam pelo Pacífico, atingindo barcos que Petro afirma transportar colombianos. Após acusar os EUA de assassinar um pescador colombiano, Trump ameaçou cortar a ajuda e impor tarifas, acusando Petro de ser um chefe do narcotráfico e aplicando algumas das sanções mais severas do arsenal americano contra o líder colombiano, seus parentes e seu ministro do Interior. O confronto rendeu elogios a Petro da esquerda global, mas causou alarme em muitos em seu país, já que a Colômbia depende dos Estados Unidos para comércio e cooperação no combate às drogas. Críticos argumentam que sua política externa é ideológica, não pragmática. Gaviria afirma que Petro acredita estar "expressando verdades que ninguém mais expressa". A ex-ministra do Meio Ambiente, Susana Muhamad, observou que a cautela nunca foi o estilo de Petro. "Toda a sua vida política tem sido correr riscos", disse ela. "Caminhar na beira do abismo para pressionar por mudanças, para criar tensão, para expor o que realmente está acontecendo." Filho de um auditor do governo e de uma dona de casa, Petro se juntou ao M-19, uma guerrilha de esquerda, aos 17 anos, revoltado, segundo ele, com a pobreza perto de sua casa nos arredores de Bogotá. Menor que as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), que operavam a partir de redutos rurais e arrecadavam dinheiro por meio do narcotráfico, o M-19 atraía estudantes urbanos, ativistas e artistas que desafiavam o que viam como uma oligarquia elitista. O grupo tentou criar uma imagem de Robin Hood, roubando leite de caminhões e distribuindo-o em bairros pobres. Embora menos violento que outros insurgentes, o M-19 realizou um dos atos mais mortais do longo conflito interno colombiano: o cerco ao Palácio da Justiça em 1985, que resultou em 94 mortes em confrontos com a polícia e o Exército. Petro, então preso por sua filiação ao M-19, não participou e relatou ter sido torturado na prisão. Posteriormente, ele ajudou a negociar o acordo de paz de 1990 do grupo com o governo, transformando o M-19 em um partido político que auxiliou na redação da Constituição colombiana de 1991. A Carta Magna enfatiza a igualdade e os direitos humanos e é considerada um dos resultados mais bem-sucedidos do processo de paz. Petro logo entrou no Congresso, ganhando destaque por expor ligações entre paramilitares e políticos, revelações que levaram a dezenas de acusações, mas também lhe renderam inimigos poderosos em um país polarizado por uma guerra complexa entre guerrilheiros de esquerda, paramilitares de direita e o Estado. Ele se tornou admirado pelos progressistas e alvo de desconfiança pelos conservadores, que nunca abandonaram a crença de que Petro é, no fundo, um insurgente esquerdista inflexível. Em um país onde a hierarquia de classes é literalmente codificada, com bairros classificados de um a seis, do mais pobre ao mais rico, Petro desafiou a elite hereditária da Colômbia. Ele abraçou sua imagem de outsider, preferindo jeans e camisas abertas e citando Foucault, apresentando-se como intelectual e homem do povo. Como prefeito de Bogotá de 2012 a 2015, reduziu as tarifas de transporte público e subsidiou a água para os pobres, consolidando sua reputação progressista, mas frustrando críticos que o viam como um idealista desinteressado nas demandas diárias de administrar uma cidade extensa e caótica. Em 2022, venceu a eleição presidencial, tornando-se o primeiro líder de esquerda da Colômbia, um marco em uma das nações mais conservadoras da América Latina. Ele prometeu transformações sociais e econômicas profundas, mas críticos dizem que ficou aquém. Embora tenha avançado em iniciativas de redistribuição de terras e ambientais, a promessa de Petro de trazer paz duradoura a um país marcado por décadas de derramamento de sangue fracassou, e sua popularidade diminuiu. Críticos conservadores denunciam seu passado guerrilheiro e sua aproximação com o regime da Venezuela, além de criticá-lo por dar aos ex-combatentes um papel formal no processo de paz. A desilusão se espalhou até mesmo para a esquerda. "Seu governo tem sido desastroso", disse María Jimena Duzán, uma proeminente jornalista colombiana que apoiou sua candidatura. "Suas políticas, muitas muito boas e realmente inovadoras, nunca foram implementadas." Defensores argumentam que os esforços para retratá-lo como errático ou incompetente fazem parte de uma reação coordenada de elites políticas e de mídia que ressentem seu poder. No entanto, embora Petro tenha sido alvo das elites por muito tempo, ele segue em frente e "sente que todos sempre o estão perseguindo", disse Federico Gómez Lara, diretor da revista política colombiana Cambio. O confronto de Petro com Trump dividiu os colombianos entre enfrentar ou apaziguar Washington. García-Peña argumentou que a apaziguamento falhou com outras nações e disse que a postura desafiadora de Petro lhe rendeu admiração no país e no exterior. Ainda assim, o desconforto está aumentando no establishment de Bogotá, disse Gaviria. "Há uma sensação de que o ambiente está se tornando cada vez mais instável e que Petro já não tem quaisquer limites." Autoridades estão ansiosas para minimizar o confronto com Trump como um mal-entendido. O ministro da Defesa, Pedro Sánchez, afirmou que Petro estava "obcecado em combater o narcotráfico", e Armando Benedetti (Interior) declarou que "nosso grande fracasso foi que não conseguimos transmitir essa mensagem a Trump". Mas Gómez Lara acredita que o presidente aprecia o conflito. "Gustavo Petro sempre viveu dentro de uma lógica de confronto", disse ele. "Ele precisa de um inimigo para funcionar. Foram os paramilitares, depois a classe política, depois Netanyahu, uma referência ao primeiro-ministro israelense. Agora é Donald Trump", concluiu.
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Esta matéria foi adaptada e reescrita pela equipe editorial do TudoAquiUSA
com base em reportagem publicada em
Folha
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